quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Intolerância intrarreligiosa

Temos trazido à reflexão o tema – e não sem motivos – da intolerância que as religiões que possuem influência das matrizes africanas têm sofrido em nosso país (desde sempre, infelizmente).

Basta nos atermos à história e verificaremos que os cultos cristãos-europeus foram (e são) os que mais resistência ofereceram. Já tivemos a oportunidade de tecer comentários sobre possíveis razões que fazem com que os intolerantes sejam assim chamados. Via de regra, fora as motivações políticas escusas, não aceita e critica o outro aquele que não conhece ou não querer se esforçar para conhecer. Ou ainda, os que buscam informações em lugares não confiáveis sobre a verdade (os fundamentos, as bases e as práticas) da religião.

Entretanto, hoje, voltemos nossa atenção para um processo mais doloroso de intolerância: aquela que vem dos que se dizem “irmãos de fé”.

Ainda que nossa explanação possa servir para muitas expressões religiosas, trataremos, aqui, de focar somente na Umbanda. Sabemos que somos uma religião plural, pois em nossas bases recebemos diversas influências (africana, européia, indígena, oriental, etc.). Isto nos torna belissimamente multicoloridos e, ao mesmo tempo, passamos a enfrentar alguns problemas devido ao fato de não termos uma uniformidade nas práticas.

Se já nos machucam as pedradas (e entendamos por pedra as físicas bem como as ofensas) daqueles que não nos conhecem e se armam das notícias inverídicas maldosamente espalhadas, imaginemos a dor que sentimos quando percebemos que o apedrejamento vem de “dentro de casa”.

Não “tapemos o sol com a peneira”. Há, entre aqueles que se dizem umbandista, alguns que não conseguem entender a prática alheia. Tão ensimesmados são capazes de dizer que qualquer coisa diferente dos processos de seu terreiro não é Umbanda. Se arvoram em criticar e só enxergam as suas verdades. Acaso conseguimos definir como única a Umbanda? Se a Casa de um irmão tem por base algo que a minha não tem, a dele não é Umbanda? Que pretensioso eu sou!

Por diversas vezes, dissemos (e seguiremos dizendo) que se a sua casa é de Umbanda, a Umbanda não é só a sua Casa.

É bom que ressaltemos (e é bem verdade) que, ultimamente, temos visto um grande número de lugares e pessoas se dizendo umbandistas, com práticas que denigrem a religião e ferem os fundamentos do que somos. Aqueles famosos “marmoteiros” que fazem trabalhos de magia que não condizem conosco ou os que “incorporam” entidades no mínimo, esquisitas (para não dizermos aberrações). Contra esta categoria temos que lutar! Temos que ganhar voz todos nós: dirigentes de terreiros, médiuns, ogãs, frequentadores de boas casas, etc. Não podemos nos calar diante de fatos tão grotescos que denigrem a nossa fé.

Mas devemos ter muito cuidado para que não acabemos indo para o extremo da intolerância, pois se assim o fizermos, estaremos agindo da mesma forma como os nossos detratores têm agido conosco ao longo dos anos.

Nem tanto ao mar, nem tanto a terra. Antes de apontar o dedo para uma prática umbandista, lembre-se de investigar o que a conforma. Busque conhecer qual é a história daquele local, quem são as pessoas que constituem o terreiro. Não corra o risco de criticar antes de buscar entender.

Intolerância é crime de qualquer jeito: seja partindo daqueles que estão “de fora” como os que se julgam “estar dentro”.

Axé!

Nosso Saravá!

quinta-feira, 5 de setembro de 2019

Orixás e sexualidade

Perdoem-me se estou ficando velho e/ou chato. Mas vejo coisas, neste mundo de meu Deus, que me espantam ao mesmo tempo em que me indignam. Questiono-me, diante das coisas que aprendi sobre a religião e me sinto perdido, achando que ou estou anacrônico demais, ou as pessoas estão perdendo o tino. Se é esta segunda opção a que ocorre, já passou da hora de haver um movimento que contenha os absurdos ligados à Umbanda.

Chegou ao meu conhecimento, pelas redes sociais, um post divulgando uma festa com base nos Orixás. Até aqui, nada de mais! Quantos terreiros promovem festas em nome de seus Pais e Mães, patronos de suas Casas? Entretanto, e para meu espanto (a rima é proposital), será uma festa em homenagem aos orixás gays.

Antes de qualquer acusação infundada sobre intolerância ou preconceito, o que aqui exponho não está ligado a nenhuma orientação sexual. Sabemos – e é notório – que de todas as expressões religiosas, as que têm influência das matrizes africanas somos as mais abertas a qualquer tipo de posição ideológica, étnica ou sexual. Não se trata disto. A reflexão é sobre a confusão que se faz (ou estão fazendo) com relação às lendas que antropomorfizam os orixás e o que eles são em verdade, no plano espiritual.

Para que fique claro, temos que entender que Orixá não tem vínculo sexual, Orixá não tem relações carnais. Resumindo, Orixá não é de carne e osso, logo não tem relação sexual hetero, homo, bi, ou qualquer outra forma de troca de energia através de sexo.

Reforçando o esclarecimento sobre a ideia de orixá compreendido como ser humano e orixá como qualidade do Divino Superior, tomemos como exemplo outra religião. Os católicos referenciam a santidade de alguns homens e mulheres que, durante seus períodos na Terra, tiveram conduta ilibada a partir do momento em que se voltaram para Deus. São exemplos de conduta religiosa e devem ser seguidos. Isto são histórias contadas para mostrar aos fiéis que é possível ser “santo” em vida e seguir os ensinamentos do Mestre Jesus.

Da mesma maneira, lendas africanas nos são contadas, onde os personagens são os orixás como seres humanos com suas qualidades, defeitos, virtudes e limitações (todas inerentes ao viver na Terra).

Um dos motivos que leva as religiões a transmitirem narrativas, contos, fábulas (muitas com base reais, outras não) é o fato de servir de modelo de conduta e superação das dificuldades e obstáculos da vida. A redenção e salvação são os ingredientes que servem de base às histórias dos “santos”.

Compreendidas tais estruturas de ensinamentos, resta-nos dizer que a confusão entre uma conduta mundana e o plano espiritual se deve a interesses que fogem à doutrina religiosa. Ou separamos as questões, por força da lógica e da inteligência, que orixá não tem comportamento de gente ou corremos o risco de macular os fundamentos que sustentam nossas religiões.

Não se trata aqui de apologia de guerra contra os que lançam mão de informações truncadas (e equivocadas) sobre a força espiritual em detrimento de quererem dar vazão aos seus desejos mundanos. Façam festas específicas para públicos específicos (apesar de eu achar que isto reforça a segregação, mas isto é outra história), mas não passem conceitos errados para leigos ou neófitos. Isto é perigoso e pode “pintar” um quadro deturpado da realidade.

Se as religiões que possuem influência de matrizes africanas já sofremos preconceito e violências de toda ordem, imaginem quando uma notícia de festa para orixá gay chega “aos ouvidos” dos que estão procurando um motivo para nos destratarem?

Reafirmo (pelo que aprendi na estrada do meu percurso religioso) que Orixá não tem denominação ligada à atributos humanos. Orixá é a manifestação do Trono de Deus, é Força da Natureza e coroa de nosso Ori, é luz em nosso caminhar. Assim, termino meu momento de reflexão pedindo aos que deitarem seus olhos neste texto: respeitemos a ancestralidade que nos trouxe até aqui e há de seguir guiando-nos até os últimos dias de nosso viver. Não confundamos nossos desejos com a beleza do panteão divinal que sustenta nossa Umbanda!

Muito axé

Nosso Saravá

quarta-feira, 10 de julho de 2019

As diferenças de Umbanda

Que diferença há entre um terreiro que possui um bom projeto de divulgação nas mídias sociais, bem estruturado, com canal de vídeos dos eventos, com post esclarecedores sobre Umbanda, um número gigantesco de seguidores e record de acessos e aquela casinha, no fundo do quintal, de dezesseis metros quadrados, onde muitos da corrente mediúnica, bem como seus seguidores, não possuem nem uma rede social?

Quais seriam as divergências entre aquelas casas com altares escalonados e iluminados com neon e outras com seus congares sendo uma única mesa com as imagens, velas e flores?

O que nos faria apontar a “qualidade” das giras? A quantidade de médiuns na corrente? As diferentes guias nos pescoços? A fila de consulentes na porta desde muito cedo? As roupas de diferentes cores segundo a sessão?

Talvez a possibilidade de haver no centro alguma pessoa de notoriedade pública capaz de tirar a casa de algum problema? Um frequentador de profissão ligada ao Direito que possa entender de leis e ajudar à casa a não enfrentar nenhuma sansão?

Se tudo isto pode “parecer”, pelo aspecto externo, algum item levado em consideração no momento de se dizer que uma casa é de Umbanda, o legado mais importante passa longe.

O que diz que uma casa é de Umbanda? Que critérios podemos estabelecer para isto?

Ando me perguntando onde estão os princípios formadores de nossa história?

Por onde caminha o humilde que acorria a benzedeira porque dinheiro não tinha pra procurar “um dotô”? Cadê a roupinha branca, modesta mas alva, alva dos irmãos de fé? Alguém tem ouvido por aí os conselhos, com alguns errinhos de concordância nominal, mas absolutamente certeiros nas soluções?

Longe de mim estar fazendo apologia de que não podemos nos adaptar a uma nova realidade. O que o meu saudosismo está gritando é pela recuperação da essência.

O que me faz umbandista não são as guias de cristal no pescoço (ainda que eu possa tê-las). O que confere a uma casa a honra do título de templo umbandista não está no conforto de cadeiras, luzes e ventiladores (mesmo que não seja um sacrilégio ter tudo isso).

Se alguma entidade que baixa nos terreiros disser algo diferente do que acredito – que a (Umbanda é amor e caridade – por favor, avise-me, pois além de estar desatualizado, devo estar louco.

Saravá, povo de Umbanda. Saravá, Pai Oxalá!

quarta-feira, 26 de junho de 2019

Filhos de um mesmo Deus

É triste constatar que debaixo do céu da existência todos sejamos frutos do mesmo ser criador e ainda não tenhamos entendido isto. Lindos são os discursos que empoderam as religiões, porém nos afastam do Mandamento Supremo do “amai-vos uns aos outros”!

Sabemos que, na Lei do Livre Arbítrio, haverá o momento de reequilibrar as ações. Tal certeza não deve nos fazer esperar calados uma justiça superior. Da mesma maneira que não podemos nos intitular agentes das correções alheias. Em outra palavras, nem devemos acatar, em silêncio, as atrocidades que desferem contra as nossas crenças, assim como não é lícito retribuir os ataques com iguais instrumentos.

Em uma linha muito tênue entre se resignar e fazer justiça com as próprias mãos está o caminho do aprendizado.

O intelecto humano é capaz de assimilar conceitos fundamentais como a gênese divinal do homem; consegue entender que, em que pesem algumas diferenças mitológicas, somos oriundos de uma mesma Força Superior, o que nos torna, em tese, irmãos da mesma caminhada chamada vida.

Se por um lado este fator racional possibilita-nos construir as relações sociais pautadas em Instituições de fé como as religiões, somos desbaratados quando desvinculamos a compreensão teórica do maremoto emocional que nos faz defender as nossas convicções. Somos avassalados pelo desequilíbrio das tentativas de convencer os outros de que somente aquilo que cremos é o que se aproxima mais da verdade. E para tanto, somos capazes de tudo. Há casos, inclusive, onde a violência ultrapassa as raias dos discursos e se transforma em atos.

Vivemos isto desde sempre, mas com o advento das notícias on line, on time, parece-nos que os casos aumentaram sobremaneira. Pelos mais diversos canais de informação vemos crescer o número ações de intolerância. Em nome de um mesmo Deus criador, homens se arvoram o direito de serem mais dignos do reconhecimento da sua linhagem divina que outros. Colocam por terra todas as doutrinas convergentes da origem da raça e terminam por dar testemunho contrário a tudo que o Senhor Jesus nos deixou de legado: no amor ao próximo!

“Até quando” tem sido a minha constante indagação diante de tantas atrocidades cometidas em nome do Pai. Certamente para tudo há um propósito e ao termos que viver e conviver com tamanhos disparates é porque está em nosso destino aprender com os conflitos.

Filhos de fé, a Umbanda nos chama na resistência, não mais da chibata das senzalas, mas na construção de uma história digna. A bandeira de Oxalá tremulará sempre que houver de nós o comprometimento com o reto agir, longe das distorções de uma falsa liberdade que gera problemas de identificação em nosso meio. Se outras denominações religiosas nos criticam pelo que veem (a aparência), reflitamos que para além do que deixamos transparecer para ter que demonstrar.

Dirigentes espirituais, médiuns, e toda a palheta de irmãos que pisam no terreiro temos a obrigação de refletir a luz divina que em nós habita. Deixemos de lado as “picuinhas” geradas a partir das diferenças de ritos para nos unirmos a uma causa muito mais nobre: a honra de nos levantarmos diante de todos e dizermos “sou umbandista”! Axé.

segunda-feira, 27 de maio de 2019

Ser umbandista


De tudo que poderíamos falar sobre o que define um umbandista, creio que o mais valioso dos traços marcantes seja o fato da atenção ao fazer o bem. Claro está que todas as demais características de quem diz professar a religião de Umbanda são importantes e nos faz ter orgulho da fé que abraçamos. É uma honra sermos sensitivos integrantes do grupo mediúnico de uma Casa; é um aprendizado constante frequentarmos as giras e sessões e, com as entidades de luz, guias e Orixás, estarmos em um processo evolutivo; igualmente é gratificante participar dos eventos de um terreiro, sejam eles, inclusive, o de limpeza da Casa, as Festas e a convivência com os demais irmãos de fé. Tudo isto é verdade!

Entretanto, cala fundo em minha alma a chance que a religião nos dá de podermos ajudar a nós mesmos através do auxílio ao próximo. Todos vivemos momentos difíceis. Todos atravessamos, vez por outra, tormentas. Quantas vezes, a Umbanda, na figura de seus guias, em terra, foram nosso alento e sustento? Quanto aprendemos com eles a superar a dor e as situações de dificuldades?

Como bem nos deixou de legado o Caboclo das Sete Encruzilhadas:

a Umbanda é a manifestação do espírito para a caridade. Não podemos perder de vista esta belíssima mensagem.

E como estamos fazendo isto? Que movimento temos tido em relação a cumprir com tal fundamento?

Como diz a sabedoria popular, “ninguém é tão pobre que não possa ajuda, e ninguém é tão rico não precise de auxílio”. Sempre podemos fazer algo por alguém e deve ser um lema para os umbandistas.

Ir ao terreiro, cumprir com sua missão de médium incorporante, participar das giras, tudo isto nos traz desenvolvimento, mas falta ainda o aprendizado da convivência com aqueles que passam (momentaneamente ou de forma mais longa) pelas privações e revezes do mundo.

Diante desta realidade, surgiu a ideia de criar um projeto para auxiliar – e assim nos auxiliar – no crescimento como fraternos seres que somos. A UMBANDOBEM é isto. Uma chance de juntar irmãos com o propósito de movimentar a energia agregadora. Umbandobem terá campanhas de auxilío a orfanatos, asilos, terreiros, e tudo o mais que pudermos. Para tanto precisamos das mãos dadas como a grande ciranda de Deus.

Conheça Umbandobem, siga nossas redes sociais (Instagram e Facebook), acesse nosso site, voluntarie-se (dirigentes espirituais, zeladores de santo, cambonos, etc.). Sozinhos somos errantes, juntos somos viajantes de um lindo trajeto chamado vida! Contamos com todos!

Saravá Umbanda. Axé!






sexta-feira, 10 de maio de 2019

O que é a Umbanda?

Este mês, faço um convite aos meus irmãos de fé para que empreendam uma pesquisa informal sobre a nossa religião. Sabemos que não podemos falar sobre a Umbanda com todas as pessoas que nos cercam (seio familiar, ambiente de trabalho ou colegas de lazer), mas sabemos, também, que há alguns com quem podemos tocar no assunto.

Minha sugestão é a de que conversem com os que não professam a nossa fé. Façam uma sondagem sobre o que elas já ouviram falar sobre a Umbanda, perguntem (e tentem não responder antes de escutarem tudo que elas sabem) qual a visão que têm, a experiência que já tiveram (se tiveram), e a visão que construíram a partir de todas as informações e vivências.

É natural, que diante de alguma dúvida de interlocutor, nosso ímpeto tente ser mais ágil que nossa paciência em ouvir, e acabemos por tentar preencher as lacunas da visão de quem está conversando conosco. Tentemos nos manter serenos (como é o perfil de quem está pesquisando) e, somente após obtermos as respostas, apresentemos o nosso entendimento.


Quais os motivos que me levam a trazer esta proposta para os leitores?


Não quero adiantar algumas conclusões, mas gostaria que considerassem alguns pontos importantes sobre a religião que se verificarão no processo desta “pesquisa”. O que é a Umbanda? Quem pisa no terreiro sabe? Quem nunca foi a uma gira entende?

Não importa se você tem 1 ou 30 anos de Umbanda, se é dirigente espiritual de uma casa, se é médium ou só assistência.

Tenho, reiteradas vezes, dito que é tempo de refletirmos sobre a Umbanda. Os tempos atuais impõem a necessidade de entendermos nosso lugar no mundo (em todos os setores). Não há instituição que se mantenha sem que se conheça de forma interna e sistêmica como ela se mantém.

O convite pode parecer que está sob um argumento político, porém muito maior que isto está a necessidade de nos enxergarmos como um órgão social e, como tal, que convive e interagem com os demais.

Alguns confirmaram suas suspeitas a respeito do que as pessoas pensam sobre a Umbanda e haverá os que se surpreenderão com algumas colocações. Aceitam o convite?

Saravá, Umbanda! E muito axé para todos nós!

segunda-feira, 22 de abril de 2019

Um projeto que não pode acabar

A Revista do Leitor Umbandista nasceu no coração e na mente de um irmão de fé que tinha o sonho de divulgar a boa literatura umbandista sem estar vinculado a projetos político-partidários ou que buscassem auferir ganhos financeiros ou lucrativos. O sonho se tornou realidade, mas quis o destino que nosso amigo Luciano Pereira (http://blog.umbandavale.com.br/) fosse habitar o Orum.

Os colaboradores da Revista, em homenagem ao legado de Luciano e a tudo que o blog representa, decidimos manter a Revista.

No mês de abril, ainda sem estar vinculada a um site específico, conseguimos disponibilizar a revista pelo Google Drive e gostaríamos que nossos amigos leitores nos ajudassem a divulgar

https://drive.google.com/file/d/1E3YHWzHmXLWij_wrIux7GSed5HlY3WS_/view

Estamos certo de que, de onde Luciano nos vê, ele está muito feliz com nosso esforço de manter este sonho.

Obrigado a todos, em nome de nossa Umbanda, em nome dos escritores umbandistas, de nossos Orixás, Entidades de Luz, Amigos espirituais.

Axé

Saravá

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Saravá, Seu Zé

As voltas que o mundo dá são muito curiosas (ou pelo menos, aos nossos olhos assim parece). Quando comecei a trilhar os caminhos da Umbanda, uma das primeiras entidades que me disse que eu deveria estar do “lado de dentro” do terreiro foi o Seu Zé Pilintra. Naquele dia, ainda me falou que todas as vezes em que eu fosse tomar uma cerveja, não esquecesse de brindar e “chamá-lo” (ato que até hoje cumpro com alegria).

Passou o tempo, Seu Zé, com toda a razão de sua observação, tem sido meu companheiro e muito tem me ensinado sobre o mundo maior que o mundo que meus olhos conseguem ver.

Eis a razão pela qual meu texto de hoje tem como base a figura emblemática do “malandro”. Uma Linha ainda não totalmente conhecida, mas, enormemente amada.

Muitas pessoas, mesmo não sendo umbandistas, nutrem uma grande simpatia pelo moço de tenro branco, gravata vermelha, chapéu panamá e sapato bicolor.

Quando digo que “ainda não totalmente conhecida” é porque vejo que em alguns locais, em suas práticas magísticas, os Malandros (e todo o campo semântico envolvido) oscila a compreensão de o que é a Linha, como se manifesta e quem a compõe.

Somos uma religião relativamente nova, se comparada a outras mais seculares. Assim, se estamos em processo de consolidação ainda, é de se compreender os motivos de encontrarmos algumas lacunas em determinadas Linhas e conceitos.

Baseado em tudo isto e também na minha própria doutrinação como médium (e as conversas “ao pé do ouvido” que Seu Zé me proporcionou) é que me aventurei na escritura de mais um livro.

Gostaria de fazer um convite a todos os leitores, irmãos de fé e amigos, para que venham caminhar comigo nas histórias que Seu Zé do Baralho me contou, tanto de sua última encarnação, como também sobre seu processo de aprendizado “fora do corpo” até receber a missão de se tornar uma entidade de Umbanda.

No livro, pequeno, de linguagem clara e objetiva, veremos algumas das diferentes formas de compreender a Linha dos Malandro, as suas formas de atuar e como se dá a relação entre as entidades que trabalham com um médium.

Espero que gostem deste livro, pois foi escrito com muito amor e respeito por “alguém” que tanto nos ensina, com suas falas bem-humoradas, mas absolutamente sérias, sobre a vida.

Aos que se interessem, podem contar comigo, seja pelo contato por aqui no blog, por e-mail (dsfilho2016@gmail.com)ou pelo Instagram (dsfilho2016).

Muito axé para todos. Salve a Malandragem. Saravá, Seu Zé!

domingo, 14 de abril de 2019

Pensar quem somos

Se compararmos a religião de Umbanda com outras como o cristianismo, o islamismo ou o judaísmo, somos um “bebê” a engatinhar.

Sem entrarmos no mérito de algumas discussões sobre a ser a Umbanda uma religião milenar, de esferas superiores ou existente desde sempre no campo da força do Criador, fixemo-nos, em termos factuais, ao “surgimento” visível das práticas umbandistas.

Em outros textos aqui, no blog, ou em meus artigos na Revista do Leitor Umbandista (http://www.umbandavale.com.br/) já comentei sobre a necessidade de se ter uma data de “nascimento” da Umbanda para a sua legitimação. Mas o fato é que, se considerarmos os cultos das diferentes nações dos negros trazidos da África para o Brasil, a sua mescla, em um ato de sobrevivência e solidariedade, podemos dizer que a Umbanda tem algo mais de cem anos somente.

Em outras palavras, ainda estamos em formação!

Se por um lado, a sedimentação está longe de ser conhecida e reconhecida, por outro, temos a oportunidade de contribuir de forma efetiva para a sua consubstanciação.

Entretanto, toda moeda tem dois lados, não é mesmo? Vejamos:

Ser uma religião ainda em formação (como dizem alguns estudiosos e representantes religiosos) traz a chance de “desenhá-la” segundo critérios mais contemporâneos, voltados para as preocupações dos dias em que vivemos e buscando acertar incorreções das incompreensões e embates das demais expressões religiosas que insistem em nos atacar, por pura ignorância e desconhecimento de quem somos e o que praticamos.

Porém, como ainda não dispomos de uma unidade (de pensamentos), corremos o risco de uma determinada “liberdade” que esbarra com invencionices dolorosas para a nossa sedimentação.

Sendo mais direto no que digo – como sempre faço ao tomar exemplos vistos das redes sociais que acompanho –, dias desses li alguns informes sobre práticas “ditas” de Umbanda mas que, particularmente, estranham-me. Começam a informar sobre linhas de trabalho que causam espanto! Surgem dentro de alguns terreiros consultas com bruxos e feiticeiros, corsários e piratas e outros tantos que – confessando meu desconhecimento – já é difícil compreender o que é a Umbanda.

Diante de tantas dúvidas (reitero que são minhas), surgem algumas perguntas:

  • Os princípios da Umbanda não se baseiam na simplicidade?
  • Quem pode dizer quais são as linhas que compõem a religião?
  • O que valida a presença de “espíritos” até então nunca visto nos terreiros como “novos” integrantes dos trabalhos?
  • O que fazemos com o afastamento dos princípios basilares?
  • Acaso a religião precisa de mais e mais linhas para se formar?
  • Não busco respostas, contudo, gostaria que aqueles que são as vozes da religião pudessem começar algum tipo de movimento para a nossa consolidação. Estaríamos nos afastando muito da vitória que a nossa história de resistência e fé nos trouxe?

    Não há nada contra outras artes adivinhatórias, outras práticas místicas… nosso mundo é grande para abarcar tudo e todos. O que me motivou, neste alerta, é tão somente uma reflexão sobre quem somos e do que mais precisamos.

    Sem ser o “arauto da sombra”, se não iniciarmos uma proposta de diálogo para compreensão da pluralidade da religião, corremos o risco de se passarem mais cem anos e os pretos-velhos, caboclos, erês, boiadeiros e outros serem somente uma lembrança de outrora.


    Confio que chegou a hora de reavaliarmos sobre quem diz o quê e que autoridade pode ter para falar em nome de uma religião que não dispõe de dogma, mas precisa de organização.

    terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

    Cortando na própria carne

    Sabemos que desde sempre, sofremos o preconceito de muitas denominações religiosas (principalmente as mais vinculadas à cultura europeia). Já no sangue e suor das chibatas, os nossos ancestrais negros tinham que esconder suas crenças, disfarçá-la no culto aos santos católicos para encontrar conforto e alento dos seus orixás para aguentar as agruras da escravidão.

    O cenário mudou para a urbanização das cidades, mas as perseguições seguiram. Apesar da criação de leis que punem todo tipo de intolerância, consagração de Dias comemorativos etc., ainda vivemos conturbações e falta de compreensão. Somos atacados; as Casas de santo quebradas; xingam-nos de adoradores do “outro”, ou seja, a ignorância galopa a passos largos e as consequências vemos expostas nos diversos tipos de mídias.

    Entretanto, não podemos “tapar o sol com a peneira”! Nossas religiões que possuem também influências africanas enfrentam problemas internos. Por diversas razões (uma delas talvez seja a falta de dogmas e regras escritas), há uma diversidade de práticas que acarretam em distanciamentos de leis fundamentais. Agora, então, na Era cibernética – ou pós-moderna, como quiserem – vemos “invencionices” que atrelam à Umbanda. São associações com outras artes adivinhatórias; inserção de falanges duvidosas, e tantas outras coisas que nos assustam.

    E os leigos “do riscado da pemba” nos julgam pelo que veem. Tomam o todo pela parte. Em outras palavras, os que nos criticam o fazem por verem tanta tolice intitulada como umbanda. Eles já não querem mesmo nos respeitar, e ainda têm essas informações truncadas e equivocadas… olha “o prato cheio” para lançarem suas farpas sobre a religião.

    Já passou da hora de uma atitude ser tomada. Uma religião inteira não pode “pagar” pelos desmandos de alguns. Já sofremos (no passado e no presente) muito para que tenhamos dentro dos próprios terreiros quem suje a nossa imagem com as tintas escuras da marmotagem.

    A Umbanda, como um todo, e seus princípios precisam de resguardo. Não estou aqui levantando bandeiras de policiamentos ou repressões. Creio firmemente que nosso dever reside em usarmos da palavra como instrumento de alerta e disseminação do que realmente nos conforma.

    É hora, é hora! Não é possível ver tantas coisas em nome de nossa religião servindo de argumento para os detratores da Umbanda. Se até nós reconhecemos que algumas práticas são mentirosas, ardilosas e difamadoras, o que podemos esperar dos que buscam avidamente motivos para nos vilipendiar?

    Lembremos, aqui, alguns fundamentos básicos de nossas Casas:


    • - somos uma religião que prega o amor e a caridade (não cobramos por isso);
    • - nossas tradições, em sua maioria, transmitidas pela oralidade, são sagradas;
    • - temos os mistérios da religião, mas não somos misteriosos;
    • - não cultuamos como um de nossos deuses a figura, criada pela tradição cristã, do chefe dos portais do plano infernal;
    • - não atribuímos títulos de líderes religiosos em cursos. Nossa formação sacerdotal é tempo de aprendizado no chão do terreiro, respeito aos mais velhos, olhos e ouvidos atentos e, obviamente, a orientação do Plano Superior;
    • - estudamos sobre a religião sim, mas não somos escola de “ensinar a ser umbandista”. As informações JAMAIS substituirão a formação;


    - Repeito, fé e dedicação constituem o sustentáculo da Umbanda!

    Por isto, meus irmãos de fé, sejamos o vento que tremula a “bandeira de Oxalá” parar que, desfraldada, ela mostre ao mundo inteiro a nossa Umbanda!

    Axé e Saravá!

    terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

    Querer, precisar e merecer

    Três verbos que não são exclusivos para a compreensão dos irmãos de fé umbandistas. Entretanto, como nosso blog tem por objetivo colaborar com as reflexões sobre a religião de Umbanda, vejamos qual a relação existente entre eles, tomando como exemplo uma conversa entre um consulente e um preto velho.

    Era dia de consulta e a moça, muito aflita, espera o momento de conversar com o preto velho. Chegada a sua vez, ela se senta diante da entidade, pede-lhe a bênção e desata a falar:

    - Vô, estou muito nervosa. Preciso muito da sua ajuda para resolver um problemão!

    - Que que “suncê” qué desse nego, fia?

    - Tô querendo muito mudar de cidade, vô! Não aguento mais a minha família. Depois que minha mãe e meu irmão morreram, minha cunhada e meus sobrinhos têm me desprezado muito. Como eles moram perto de mim, vejo sempre da janela que eles fazem festas, reuniões de família e nem ligam que eu existo. Quero muito ir embora. Preciso, vô! “O que os olhos não veem, o coração não sente”, não é isso que dizem?

    - Antes de carquer coisa, fia, suncê pricisa entender argumas coisas. Nem sempre o que se qué é o que se pricisa. Num é ansim não!

    - Como não, vô? Eles me maltratam ignorando minha existência!

    - Suncê é qui tá falando que eles martratam suncê. Vô explicá pra suncê! Das vez, quando arguma coisa incomoda a gente, a gente pricisa entendê purque ela incomoda, num é? Já se pirguntô purque eles faz isso? Num tô falando que eles num tem culpa não. Mas aqui, o importante é vê como suncê podi crecê como pessoa. Sinhá, quando insinava pros moreque da senzala sobre as coisa da bríblia, dizia: “se o seu dente mordi a sua língua, suncês arranca o dente fora?” E isso é vredade. Si arrancá o dente resolvesse a questão, todo mundo ficava era banguela pra num tê probrema, num é?

    - Mas se eu me mudar, vou esquecê-los também e sofrer menos.

    - Suncê tá certa disso?

    - Bom, eu acho, né, vô!

    - Oia só, nem sempre o que as pessoa qué é o que elas pricisa pra melhorá, sabia? Nem sempre o que se acha que se pricisa é o que elas merece. Suncê já parou pra pensar proquê Pai Oxalá corocó suncê ali naquele lugar? Num tô farando que num é pra saí. Tô farando que antes de pedir, pricisa escutá o coração e a alma pra senti o que realmente é importante.

    A conversa levou um bom tempo, a jovem, secando as lágrimas, prometeu ao preto velho que durante a semana toda refletiria sobre a conversa para na outra consulta voltarem ao assunto.

    O maior ensinamento da conversa entre o preto velho e a moça reside em um dos fundamentos mais bonitos da Umbanda: a melhora interna de cada um. Nossa religião não é comércio onde a pessoa chega, escolhe a mercadoria exposta e leva para o caixa para pagar. As entidades de luz que “baixam” em nossos terreiros nos ensinam, a todo tempo, que viver é buscar atravessar as dificuldades da vida, sem perder a fé! Nenhum umbandista pode ter em mente que, pelo simples fato de frequentar uma Casa santa, ele se livrará de tudo aquilo que “pensa” ser um estorvo.

    A Sagrada Lei de Umbanda nos mostra nossas fragilidades, como também nos faz crer na força que temos. Com o cotidiano e a convivência do terreiro, vamos aprendendo que não somos infalíveis e muito menos inatingíveis, mas somos protegidos! As religiões espiritualistas não estão para nos servirem como “moeda de troca” segundo a visão equivocada de alguns. O contato com as forças das naturezas manifestadas nas formas plasmadas de entidades nos traz a oportunidade de autoconhecimento.

    Esta é a razão mais clara de entendermos que nem sempre o que queremos é o que precisamos. Muitas vezes, para nosso maior aprendizado, o plano divino nos permite estar em situações onde enfrentá-las é mais importante do que nos afastar. O “livramento” reside na questão do merecimento que não é julgado por nós. Não temos condições, ainda, de sermos os juízes isentos das nossas próprias atitudes. Tudo fica a cargo e critério do divino.

    Desta maneira é que as palavras do preto velho na conversa com a jovem aflita se fazem sábias. Antes de “pedir” qualquer coisa, devemos ter um exame criterioso sobre nossos dias para entender se o que “desejamos” é possível (e por que é) ou se “precisamos” estar (ou viver) algo e, ainda, se é de nosso merecimento!

    Por isto, caro amigo, irmão do caminhar, antes de pisar no terreiro para pedir, ouça a sua alma e pergunte-se:

    quero, preciso ou mereço.

    Ninguém está dizendo que não lhe é facultado pedir. Estamos dizendo que é preciso estar preparado para vivenciar as experiências que a vida nos reserva com força, foco e fé!

    Saravá, Umbanda. Axé, irmãos.

    terça-feira, 22 de janeiro de 2019

    Respeite a minha Umbanda porque eu respeito a sua

    Mais uma vez, trago-lhes um tema sensível sobre a nossa religião que merece ter um espaço para a reflexão: os problemas intrarreligiosos. Tenho, por diversas vezes, apresentado alguns questionamentos que são frutos de conversas com irmãos de fé que labutam pela organização, respeito e legitimidade da Umbanda.

    O cenário atual caracterizado por uma maior informação sobre os acontecimentos nacionais tem revelado um aumento significativo de enfrentamentos relacionados a questões de incompreensão e não aceitação da crença alheia. Basta que abramos um de nossos navegadores e coloquemos “intolerância religiosa” para vermos dados estatísticos, política para combate de crimes religiosos, solidariedade e apoio diante das atrocidades. Ainda é pouco efetivo, mas são os primeiros passos. Que não percamos a esperança e mantenhamos a crença de que o caminho é a harmonia e evolução humana!

    Entretanto, o cerne de nossa “conversa” não ultrapassará os muros do terreiro. Os problemas inter-religiosos são patentes, como mencionamos acima, nas redes sociais, nos noticiários e na vida (quem de nós nunca ouviu um umbandista ou candomblecista relatar um episódio de violência sofrida?).

    Retomando a estrutura de apresentar algumas discussões que tive com amigos-irmãos, no final do ano passado, participando de um bom debate sobre nossa Umbanda, vimos diversas histórias de adeptos da religião revelando uma determinada inflexibilidade com relação à prática de outras Casas. Imaginem, caros leitores, o que podemos pensar quando vemos umbandistas, cheios de razão, dizendo que a Tenda de outro umbandista não é Umbanda pois não segue os mesmos passos da Casa de quem fala? Mais ainda, se compreendemos a pluralidade da religião (pelos motivos sociais, regionais, culturais, históricos, etc.), como podemos apontar o dedo para outro irmão de fé e afirmar que para ser Umbanda tem que ser assim, assado, cozido e ensopado?

    Creio que muitos estão, neste momento, entendendo o teor do texto e estão se lembrando de cenas onde a situação aconteceu.

    Já mencionei, em meses anteriores, uma das minhas cautelas ao ver os “donos” da Umbanda ditando suas regras como dogmas e criticando aquilo que diverge de suas formas de cultuar o sagrado.

    Longe de mim que fique parecendo que sou contrário a medidas de proteção e prevenção da religião, pois, na mesma medida das intolerâncias inter e intrarreligiosas, vemos também um processo de divulgação de fundamentos que não são de Umbanda e que alguns “sem-noção” tem afirmado pertencer a nossa fé. Os marmoteiros, os criadores de rituais estapafúrdios, isto sem falar nos “inventores” e complicadores de algo que é tão singelo, simples (sem ser simplório) que é a Umbanda.

    É triste chegarmos a tais conclusões, mas a Umbanda, em expansão, precisa de cuidados. A Umbanda não é de ninguém, mas é de todos. A Umbanda não tem dogmas, porém tem fundamentos. É tempo de se pensar em formas de alinhamentos, sem enclausurar. Não podemos perder a chance do diálogo fraterno. O que não é mais possível é percebermos o que alguns estão se arvorando como controladores das bases da religião e permanecermos parados, pois corremos o sério risco de que em pouco tempo, além das diferentes formas da mesma fé, vejamos criações absurdas que venham a ferir o amor e a caridade, símbolos da religião natural de Umbanda.

    Termino minhas palavras valendo-me – mais uma vez – da frase de um grande amigo espiritual que me acompanha e muito me ensina:


    “A Sua casa pode ser de Umbanda, mas a Umbanda não é só a sua casa!”

    Pensemos sobre isto!

    Saravá, Umbanda. Axé, irmãos de fé!