terça-feira, 11 de dezembro de 2018

A Umbanda nos tempos de hoje

Sei do risco do tema, mas não posso evitar abordá-lo. Tentarei, na medida do possível, e sem “criar mossas”, apontar alguns pontos de vista, a partir do cenário atual, de como devemos ter atenção com relação aos rumos das nossas religiões com fortes influências de outras matrizes que não exclusivamente a cristãs.

O mundo, por diversos motivos que aqui não nos cabe apontar, encontra-se em um momento de tensão entre os blocos conservador e progressista. Muitos dos resultados estão presentes nas relações sociais e políticas. Vimos, faz pouquíssimo tempo, estes confrontos travestidos no binômio partidário de “esquerda” e “direita”. Acirradas opiniões, inflexíveis papéis, contendas familiares e de amizades em nome de informações tantas vezes distorcidas da realidade. O planeta globalizado “jorra” notícias que não se preocupam com comprovações, muitas vezes, e os homens, presos às telas de seus aparelhos, terminam tomando como totalitárias algumas fragmentadas verdades.

E o que isto tem a ver com as religiões?

Não é difícil encontrar os pontos de contato. Vejamos.

No passado, não muito distante, as relações de poder ou estavam diretamente nas mãos de determinados segmentos religiosos, ou algumas igrejas se encontravam muito imbricadas nas decisões políticas de países e na condução das “regras” de convivência social. Prova disto está em alguns livros sagrados que ditam normas e fazem seus seguidores crerem que os papéis sociais são esse, aquele ou aquele outro. Criaram-se sociedades machistas, algumas outras intransigentes, outras ainda perseguidoras em nome do divino, e por aí vamos.

No Brasil, a catequização dos “selvagens” e “insubmissos” trouxe dor, fugas, lágrimas e gerou preconceitos na mesma medida em que trouxe alianças para a Igreja católica que lhes foram muito úteis. Não é uma crítica, é uma constatação, como também vemos em grande parte do continente sul-americano!

O resultado (que também não é uma novidade para ninguém) foi o desenvolvimento de outras práticas religiosas de forma clandestina e sob repressão (inclusive do Estado).

Passou o tempo, o grito de conscientização e de “modernidade”, que diz não haver motivos para repressões e/ou perseguições, foi ouvido e buscou dar às religiões um espaço diante da legalidade, mas ainda muito distante da liberdade religiosa (que somente na teoria fica bonito falar).

Alinhavando o tema das tensões dos conceitos político-social de conservador e progressista (direita e esquerda e por aí vai), e sabedores de que nossas religiões por não possuírem dogmas (que por um lado não nos amarram, mas por outro, franqueiam a práticas incontroláveis), parece-me oportuno refletir sobre o futuro que nos aguarda.

Não é a apologia da necessidade de se criarem regras fixas através de dogmas, mas pensarmos em uma forma de como buscar a legitimação da religião.

Após os episódios políticos recentes no país, vi um grande número de pessoas se dizendo assustadas por acreditarem que alguns segmentos serão perseguidos ou, até mesmo, extintos. Não sou o arauto da sombra, porém não me considero um esperançoso fora da realidade. Há coisas que não podem mais voltar para trás.


"Problemas intrarreligiosos podem colocar em cheque a nossa liberdade de expressão."


A questão é: podemos vir a sofrer algum tipo de sanção? Óbvio que sim. Somente como exemplo rápido, a cidade do Rio de Janeiro tem visto alguns “desmandos” quando se tratam de religiões diferentes das professadas por determinados governantes. (novamente não é especulação, é fato!)

Outro ponto que corrobora com o alerta – e este tenho debatido muito com outros irmãos de fé – é a situação em que a Umbanda se encontra. Há uma relação tensa entre determinadas “escolas”, principalmente pela propagação de fundamentos e práticas através de cursos pagos e da internet de forma indiscriminada. De um lado, a explicação de que são somente informações (e não formação) e do outro a contestação pela tradição do tempo que se deve ter de terreiro (aprender fazendo com orientação dos mais velhos).

De qualquer forma (e já ouvi de pessoas de outras religiões), a percepção que alguns têm é que nossa religião ainda carece de organização. Muitos entendem que se há tanta diversidade em abordar e conduzir a religião é porque nossas práticas são primitivas e desprovidas de seriedade. A falsa impressão de que cada um faz o que quer a seu bel-prazer!

Sabemos que estamos longe disto, mas, os problemas intrarreligiosos podem colocar em cheque a nossa liberdade de expressão.

A solução não é simples e demandaria um processo de médio e longo prazo. Recentemente, li comentários e textos sobre a criação de uma “Carta Magna” da Umbanda. Vi que não houve (e ainda não há) unanimidade, mas me parece um começo.

Como a questão da Carta (ou outro documento normatizador ou, ao menos, que possa servir de legitimação) é complexo, convido-os ao nosso próximo texto.

O que hoje queria era iniciar uma reflexão sobre, diante do que estamos vivendo, como devemos prosseguir.

Na certeza de que a Umbanda é nossa bandeira – a bandeira de Oxalá –, fica aqui o meu pedido de maleme aos nossos orixás!

5 comentários:

  1. Vejo pessoas Umbandistas escondendo a sua religião por medo. Sei que estamos passando por um momento turbulento...mas sei também que não pode voltar a ser o que era antes. Temos que levantar a nossa bandeira. E da mesma maneira que aceitamos todas as religiões...também queremos que aceitem a nossa. Que Oxalá nos guie, nos abençoe e nos proteja. Axé.

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  2. Sim. A necessidade de uma normatização na nossa religião é urgente! Como disse um preto-velho: “A Umbanda é o seu terreiro, mas seu terreiro não é a Umbanda!”, mas o que não pode acontecer é cada um falar a mesma coisa de modos MUITO diferentes e às vezes, destorcidos. Comecemos dentro do terreiro com a doutrina do médium que cada vez menos se interessa em estudar as religiões e sua própria religião. Só pelo conhecimento chegamos a algum lugar e será pelo conhecimento que nos uniremos numa só voz! Axé!

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  3. A modernidade tem deixado um legado de imediatismo que ronda tb os umbamdistas que querem tudo na pressa.... formação é pé no chão, e lavar terreiro, e participar da vida familiar espiritual... mas muitos têm achado que ler na internet lhes faz umbandistas. Ler ajuda e muito ao conhecer, mas não traz o ser. Parabéns pela colocação. Axé.

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